domingo, setembro 26, 2004

segunda-feira, setembro 20, 2004

O LOUCO

Em plena avenida Angélica
A vala de esgoto aberta exalava um fedor intratável.
O louco fumava um cigarro.
O louco espantava o mau cheiro
A brasa tocando os lábios.
O louco dançava um tango
Fremia gozava
Esbaforido em fumaça.
O louco entendera a vida
__ Baile sem nexo __
Mas com que ritmo
O louco dançava !

O louco prenúncio de vida
Insuspeita __ desfeito __
dançava um tango.

Chovia.

domingo, setembro 19, 2004

BALANÇO, BALANCÊ

Quero um balanço
onde eu pouco caiba
conquanto estampado
em mim o menino
de ontem e sempre

Quero o balancê
O gozo do sexo
- nudez, despojamento -
total semelhança
com a criação

sempre excitada
de puro poema
o gozo perfeito.
Quero um balanço
num espaço patético.

Um balanço lúdico
onde caibamos
eu e minha amada
eu e minha Poesia
libertos pra sempre

da vida finita!

sexta-feira, setembro 17, 2004

RECONQUISTA

I

Suores novos, suores antigos escorrem.
Existe o cansaço. Colarinhos sujos. Promessas
[acendendo faróis.
Mas eu chego àquele ponto
em que tudo se dissolve
no mesmo almofariz silencioso:
Minha serra, aquela praia, eu sozinho que me importa?
Meu caminho é belo
ainda que a timidez, as dores, os obstáculos tantos,
[dia após dia... ano após ano... e a madureza
[afinal conquistada -
mas já sem préstimo.

II

Retorno ao início do drama
onde cada desejo renasce.
Sou um artista refazendo o caminho
que meu corcel extraordinário e leve...

- Reconquista.

CANÇÃO DA INACESSIVEL LUZIA


Aquela estrela luzia
na minha falsa euforia.

Aquela estrela luzia
no fim da tarde erradia.

*

Aquela estrela: um guia,
na minha noite sem dia.

Aquela estrela: em dia,
esta noite mudaria.

*

Aquela estrela um dia...
— Inacessível Luzia!

quarta-feira, setembro 08, 2004

TRÍPTICO

I- Menina

A filha, pelo retrovisor:
— Pai, por que você está chorando?
— Minha filha é segredo
disfarcemos, diga nada.
— Pai, por quê?
— Minha filha ouça e cale
palavras da minha boca:
Já chorei de solidão,
de tristeza, nostalgia.
Já chorei de comoção
e desta dor que me angustia.
Já chorei de compaixão,
vaga esperança... alegria.

Crianças em Coro:
— De alegria?!
— Eba!... Eba!...

A filha clamando:
— De alegria, pai!... De alegria!

— De alegria.

II - Moça

No eletrocardiograma
que o pai acompanha
(e mudo se afasta)
os eletrodos circundam
a pura Poesia
de um seio crescendo...

Enquanto isso
um seio formado
é intensa força
da Natureza
susto, enternecimento
que me atravessam.

Os impulsos registram
milimetrados e claros
um projeto de avô
(subitamente traçado,
na nitidez do papel
que a emoção embacia.

Mas o papel sou eu
sou eu minha filha
meu amor inda verde...
— Amadurecido!
Pomar filha pai
profundamente em mim.

III - Mulher

Te dou

um setembro, alguma lua
dois mimos, breve recado.

Uma estrela cadente
o sol que vai nascer.

A primeira esperança do dia
faca de pão, toalha de mesa, cotovia.

Te dou algum dinheiro
te arranjo namorado.

E isso, ainda é nada.

*
Minha herança melhor
(única talvez)
é algo que trago
no fundo do peito
enchendo o vazio

(o meu... o da vida)
um sopro celeste
jamais dissipado:
— Meu éter de poeta,
Mariana, minha filha.

SIMPLESINHO

Acordo com dedilhada melodia.
Um chorinho
(desses com que Mariana madrugava)
orvalha este poema:
— Ração deste dia:

— Razão de existir.

quarta-feira, setembro 01, 2004

VOCÊ

Você furou
o caos implícito, a sede infinita.

Você floriu
árdua. Inelutável.

Você amou
a ausência mesma de amor.

Resgatou tudo.
Coloriu tudo.