quarta-feira, abril 04, 2007

Lira para Manoel Bandeira

I/ Antologia (Revista e diminuída)

A vida inteira que podia ter sido o que não foi
Vou–me embora pra Pasárgada
Quero esquecer tudo
Felizmente existe o álcool na vida.
Perdi o Jeito de Sofrer.
Ora essa. Não sinto mais aquele gosto cabotino da tristeza.
Hoje tomo alegria.
Quero a delícia de poder sentir as coisas mais simples.
Humildemente pensando na vida e nas mulheres que amei.

E minha vida ficava
Cada vez, mais cheia
De tudo
Pura ou degradada até a última baixeza
Eu quero a estrela da manhã.

Tu que me fizeste assim, Emanuel...

II/Carta

Estou-te encaminhando minha lira
Trilhando rugas
Que a poesia te sulcou
Poeta.

Mas já não tens endereço entre os homens
Um dia tiveste?

Tua mensagem celeste nos chega em versos singelos
De uma fidelidade que a tudo resiste
Perfurando, intacta, os furos jornalísticos e os partidos políticos do nosso país e nosso tempo.
Sem doutrina e as mais belas orações. Nelas, somo nós, teus devotos, que rezamos
Assim se perpetuam preces
Na fala do povo brasileiro
Esse povo que capturas em teus poemas
Este povo que tanto amas...

*

Tua humildade e paixão encadeadas
Banham os oito mil quilômetros de costa, os carvoeirinhos, Misael funcionário da Fazenda, os camelôs nas calçadas, o beco onde moraste...
Encadeadas, alagam tudo... vazando incautamente a maioridade que buscavas ocultar.

Contido sofremos:
Tua tosse, óculos, versos.
E menos compreendemos e mais sentimos tu mesmo, tua poesia.
Contigo nos comovemos
E sorrimos, ingênuos, na volta ao mundo a que nos levas numa casquinha de noz.
Contigo percorremos:
Susto, emoção, raio
— Teu alumbramento!
(Vamos viver de brisa Anarina?
O meu reino pelas três mulheres do sabonete
(Araxá)

Contigo vivemos
A perfeita arquitetura
A coletiva aurora


III/Rosa e Estrela

Vi tudo quanto é mais belo
Vi tudo aquilo que existe
Vi tudo que subiste
No sempre igual cotidiano.
Na frente do cotidiano
Por trás do céu e do mar
Em cada rosa, anônima
Em cada estrela no ar.
Na estrela, dele luzindo
Em minha vida verdadeira.
Vi tudo! – Do escritório...
Lendo e amando Bandeira.


IV/ Como ele me pediu

Meu Nosso Senhor
Tirai essa ânsia
Do meu coração.
Não é de dinheiro, de glória, poder.

Nem é de carinho
(que nunca faltou)
É de poesia
— Poesia presa no coração.

(Meu Nosso Senhor
Paixão mais intensa
Não existe não.
Meu nosso senhor
Tirai essa dor...
Do meu coração
Que dor mais doída não existe não
Meu nosso Senhor


V/Tributo Meigo

Manuel:
Ídolo carinhoso.
Mito, sem mistificação.

Manuel
Cada dia mais forte:— Luz da minha vida inteira